O desafio em gerir a saúde corporativa no Brasil
O desafio em gerir a saúde corporativa no Brasil
Marcelo Ferraz Sampaio, cardiologista e coordenador do Pronto Atendimento do BP Mirante, foi o mediador dos debates sobre saúde corporativa no Brasil, durante o Global Forum – Fronteiras da Saúde, realizado entre os dias 3 e 4 de outubro em São Paulo.
Em sua fala, o gestor médico ressaltou as conexões que permeiam o setor e frisou a necessidade de se discutir a forma como as empresas – nas mais diversas áreas de atuação, estão cuidando da saúde de seus funcionários. “Apenas 51% das empresas têm uma gestão estratégica na área da saúde”, destacou o mediador.
O tabu de se abordar problemas como a saúde mental e o número crescente de afastamentos por burnout, decorrentes de ambientes de trabalho nocivos, a judicialização e seus efeitos sobre o custo da saúde para operadoras, empresas e usuários da saúde suplementar, a importância do uso da tecnologia para traçar os perfis epidemiológicos que auxiliem na tomada de decisão para implantação de estratégias eficazes de gestão de saúde, a necessidade de troca de informações sobre os pacientes entre os players da cadeia e os impactos da LGPD permearam as discussões da mesa moderada por Marcelo Sampaio.
Entre as debatedoras estavam Milva Pagano, advogada e presidente da Associação Brasileira dos Profissional de Recursos Humanos (ABPRH, antiga Aapsa), Cibele Castro, executiva da área de gestão de pessoas com larga experiência em empresas globais e locais como GE e Latam Airlines, e a jornalista Daniela Diniz, atual diretora de Conteúdo e Eventos do Great Place to Work (GPTW).
Barreiras e Desafios
Mesmo considerando-se otimista, Milva Pagano ressaltou que o próprio sistema de saúde é um grande dificultador para uma gestão de saúde corporativa eficiente, por focar o tratamento de doenças e não a promoção da saúde por meio da prevenção e da informação.
“Ao falarmos em gestão de saúde dentro das empresas, estamos na realidade nos referindo à gestão de sinistros. Por isso, é uma despesa tão alta.”, explicou Milva. Ela destacou ainda que é preciso educar o colaborador, conscientizando-o de que é corresponsável pela gestão de sua saúde. “Pronto-socorro não é lugar de se realizar consulta. É preciso mudar esta cultura. Ter ações pontuais não significa ter gestão estratégica de saúde, que precisa estar no core da empresa e integrada à própria cultura organizacional”.
Cibele Castro lembrou que os gastos das empresas com a saúde de seus colaboradores só perdem para os da folha de pagamento e destacou como desafios o envelhecimento da população – que prevê que o Brasil tenha 14 milhões de idosos em 2020, e própria legislação da saúde suplementar (lei 9656/98). “A lei garante ao funcionário desligado a continuidade do plano, ainda que por um período, o que onera as empresas e abre margem à judicialização no ambiente corporativo”, explica a executiva.
Ela ressaltou que “hoje, dentro das empresas, a maior preocupação é a saúde mental do colaborador, problema que está crescendo”. Por isso, Cibele acredita que é preciso atuar muito mais na educação para a prevenção por meio do cuidado integral com a saúde e o do uso consciente do sistema de saúde. Para ela, a partir da análise dos dados de saúde populacional coletados nos ambulatórios corporativos e do engajamento dos colaboradores e seus familiares em programas de promoção de saúde, é possível reduzir a sinistralidade e, consequentemente, os custos.
O ponto de vista do colaborador
“Houve um boom de coparticipação sem educar e conscientizar os funcionários para a corresponsabilidade”, salientou Daniela Diniz do Great Place to Work (GPTW).
Ela disse que nos quase 25 anos de pesquisa, percebe uma mudança no mindset não só das empresas – que passaram a gerir a saúde e não mais a doença, mas também do funcionário. “Atualmente o colaborador dá um peso muito maior a quanto a empresa está proporcionando um ambiente e líderes não tóxicos e em linha com o que ele enxerga como qualidade de vida, do que aos benefícios que ela oferece (como o plano de saúde)”.
Nem lobo mau, nem chapeuzinho vermelho
Ao serem provocadas pelo cardiologista Marcelo Sampaio sobre quais seriam as 3 soluções que elas apontariam para resolver a gestão de saúde corporativa, houve uma quase unanimidade de opinião entre advogada, jornalista e executiva: mapeamento, engajamento e educação.
“Engajamento, educação e conscientização são fundamentais. Não existe lobo mau, nem chapeuzinho vermelho nesta história. Quem contrata os serviços de saúde tem de sair da zona de conforto, assim como as operadoras têm de abrir informações sobre os atendimentos que realizam”, ressaltou Milva Pagano.
Conhecer o perfil de saúde populacional da empresa também é importante para uma gestão eficaz e isso envolve, além do mapeamento clínico em si, ouvir os colaboradores.
Daniela Diniz citou o exemplo da Starbucks que oferecia como benefício aos colaboradores com problemas de saúde mental um acompanhamento psicológico. Porém, quando foram ouvir os funcionários, perceberam que apenas 5% deles se beneficiavam daquele recurso. “A comunicação com o colaborador, envolvê-lo no processo, é fundamental para que o plano de ação funcione”, concluiu.